Os esports, ou esportes eletrônicos, têm se consolidado como uma das indústrias mais promissoras no campo do entretenimento e esporte mundial. Com milhões de fãs e um mercado crescente, a competições de jogos eletrônicos têm atraído tanto investimentos quanto debates sobre seu reconhecimento oficial como esporte e a necessidade de uma regulamentação jurídica específica.
A indústria de jogos já ultrapassou o cinema e a música em termos de receita. Estimativas indicam que o setor de games movimenta entre 120 e 160 bilhões de dólares, dependendo da fonte e do estudo. Os números não mentem: o mercado de games supera a soma das indústrias cinematográfica e musical.
No Brasil, o crescimento dos esports também vem acompanhado de desafios legais, especialmente sobre a regulamentação de organizações e competições, direitos dos jogadores, entre outros, razão pela qual este artigo busca analisar as tendências jurídicas da modalidade no país.
De início a principal dúvida é: esports podem ser considerados esportes?
Especialistas e estudiosos divergem. De um lado se defende que os esports compartilham características fundamentais com esportes tradicionais, como competitividade, treinamento disciplinado e envolvimento em competições organizadas.
Um ponto de apoio dessa argumentação é o crescente envolvimento de federações esportivas internacionais no esports, além do reconhecimento em grandes eventos globais, como os Jogos Asiáticos de 2022, e a primeira edição da Semana de Esports Olímpicos que ocorreu em 2023.
Além disso, o Comitê Olímpico Internacional (COI) aprovou a criação dos Jogos Olímpicos de esports, cuja primeira edição ocorrerá em 2025.
Por outro lado, há quem defenda que a falta de esforço físico intenso, característica marcante dos esportes tradicionais, impede o reconhecimento pleno dos esports como esporte.
No Brasil, o debate permanece acirrado, sem que haja, até o momento, um consenso sobre o status jurídico dos esports, até mesmo porque a Lei Pelé, que define normas gerais do desporto, não prevê expressamente sua aplicação para a modalidade.
Por sua vez, a Lei Geral do Esporte define que esporte é “toda forma de atividade predominantemente física que, de modo informal ou organizado, tenha por objetivo a prática de atividades recreativas, a promoção da saúde, o alto rendimento esportivo ou o entretenimento”.
Tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei 205/23 que busca definir os esports como modalidade esportiva para todos os efeitos legais.
De qualquer forma, a legislação esportiva brasileira pode ser utilizada, ainda que de maneira subsidiária, para nortear alguns aspectos do esports, como contratos entre jogadores e organizações, gestão de competições, e até a aplicação de sanções em competições, especialmente porque não há qualquer proibitivo legal.
Portanto, a Lei Pelé pode ser utilizada para regular a transferência de jogadores, especialmente para proteção dos seus direitos em transações com clubes ou organizações de esports.
Os direitos trabalhistas dos jogadores de esports constituem um dos aspectos mais sensíveis da regulamentação desse setor.
No Brasil, para que uma relação seja caracterizada como de emprego, é necessário que estejam presentes os requisitos previstos no artigo 3º da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), quais sejam: (i) trabalho prestado por pessoa física; (ii) com pessoalidade; (iii) mediante subordinação; (iv) de forma não eventual; e (v) com remuneração.
Em uma análise rápida da relação entre atletas de esports e suas organizações, muitos desses requisitos são preenchidos, especialmente quando o treinamento e dedicação se equiparam aos atletas profissionais de outras modalidades.
Em muitos casos os jogadores prestam serviços de forma contínua, obedecendo a regras e treinamentos estabelecidos pelas organizações, o que caracteriza a subordinação e a não eventualidade.
Ademais, a remuneração é garantida por meio de salários e prêmios, o que também preenche o critério de onerosidade.
Assim, embora não tenha previsão específica para a modalidade, a CLT pode ser aplicada de forma análoga, de modo que a relação entre atletas de esports e organizações pode configurar uma relação de emprego, garantindo aos jogadores direitos como férias, 13º salário, Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) e outros benefícios trabalhistas.
Diante do exposto se verifica que os esports estão em um momento de destaque no Brasil e no mundo, mas ainda enfrentam uma série de desafios jurídicos.
O reconhecimento formal como esporte é um ponto fundamental que precisa ser superado pela nossa sociedade, uma vez que o ordenamento jurídico deve acompanhar a evolução dos esports e garantir a proteção dos direitos de todos os envolvidos com a modalidade.
Fonte: Dra. Bárbara Mengue Chelski
Comments